4/15/2008

Ao meu belo pai ex-emigrante

Pai:
As maternas palavras de signos
Vivem e revivem no meu sangue
E pacientes esperam ainda a época de colheita
Enquanto soltas já são as tuas sentimentais
Sementes de emigrante português
Espezinhadas no passo de marcha
Das patrulhas de sovacos suando
As coronhas de pesadelo

E na minha rude e grata
Sinceridade não esqueço
meu antigo português puro
que me geraste no ventre de uma tombasana
eu mais um novo moçambicano
semiclaro para não ser igual a um branco qualquer
e seminegro para jamais renegar
um glóbulo que seja dos Zambezes do meu sangue

E agora
Par além do meu antigo amigo Jimmy Durante a cantar
E a rir-se sem nenhuma alegria na voz roufenha
Subconsciência dos porquês de Buster Keaton sorumbático
Achando que não valia a pena fazer cara alegre
E uma Algarve de amendoeiras florindo na outra costa
Ante os meus sócios Bucha e Estica no “écran” todo branco
E para sempre um zinco tap – tap de cacimba no chão
E minha mãe agonizando na esteira em Michafutene
Enquanto tua voz serena profecia paternal: - “Zé:
Quando eu fechar os olhos não terás mais ninguém”.

Oh, Pai:
Juro que em mim ficaram laivos
Do luso - arábico Algezur da tua infância
Mas amar por amor só amo
E somente posso e devo amar
Esta minha bela e única nação do Mundo
Onde minha mãe nasceu e me gerou
E contigo comungou a terra, meu Pai.
E onde ibéricas heranças de fados e broas
Se africanizaram para a eternidade nas minhas veias
E teu sangue se moçambicanizou nos torrões
Do sepultura de velho emirante numa cama de hospital
Colono tão pobre como desembarcaste em África
Meu belo pai ex-português.


José Craveirinha ( 1923 – 2003)no livro “Karingana ua Karingana” 1974 ao seu Pai

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